O publicitário Ricardo Chester é um veterano na Maratona de Chicago, que acontece neste domingo (13/10). Apaixonado pela prova, uma das seis principais do mundo, que, junto com Tóquio, Boston, Londres, Berlim e Nova York, formam a Majors, Chester fez uma deliciosa crônica com dicas sobre a corrida. Ele quer voltar à cidade dos ventos no ano que vem para completar cinco maratonas em 10 anos (2011, 2012, 2013, 2014 e 2020), e ter o direito a participar das provas seguintes sem disputar uma vaga nas loterias. A ESPN 2 transmite a prova a partir das 9h (Horário de Brasília). Também há um app da maratona na Apple Store e do Google Play para acompanhar os corredores.
“Chegou a hora.
Domingo agora tem Chicago Marathon.
Tive a sorte de correr esta prova entre 2009 e 2014.
Tomo a liberdade, e também um pouco da sua paciência, para listar algumas pequenas sugestões.
Elas serão válidas em especial para os corredores estreantes, seja na distância, seja na prova em Chicago.
Fiz minha primeira maratona lá em 2009 e posso garantir, até por experiências posteriores em outros 42km: Chicago é o lugar certo para uma estreia.
Imagino que a poucas horas de largar no Grant Park sua adrenalina esteja bombando pelas glândulas, que as noites de sono estejam mais atrapalhadas.
Tá tudo nos conformes.
É assim mesmo.
Mas vamos ao que interessa.
As dicas da Maratona de Chicago
Começo com uma muito útil, que rola assim que você sair com suas malas pelo saguão do aeroporto.
O metrô em Chicago, o segundo mais movimentado do mundo, sai de dentro do Aeroporto de O’Hare. Literalmente de dentro.
Sem essa de pegar táxi, carece não.
Deixa para gastar na Expo.
Você vai andar uns poucos minutos e vai ver a estação no aeroporto mesmo.
Aliás, ver não. Você vai chegar na estação do trem quase sem perceber. O arquiteto do aeroporto, projetado pelo escritório C.F. Murphy, sabia das coisas. E sabia que numa cidade com o inverno de Chicago seria melhor pegar o trem sem sair para a rua, e assim é.
O nome da linha: Blue Line.
Transporte público, sempre
Outra dica: compre logo um bilhete para cinco dias. Se não souber manejar caixa de venda automática, o guarda da estação te ajuda. Tem até um bilhete comemorativo à Chicago Marathon, que você pode guardar de recuerdo depois de usar: https://www.ventranow.com/marathon.
Esse cartão te dá acesso a metrô e ônibus integralmente.
E é muito fácil andar por Chicago de metrô/ônibus em que pese o fato de que você não deve andar porque, vamos combinar, você foi até lá para correr 42km e andar muito nos dias anteriores não vai ajudar em nada.
A melhor feira de artigos para corrida
Por isso mesmo, a segunda dica é você retirar seu número de inscrição na Expo na sexta-feira e explico: você vai estar talvez na maior e melhor feira de artigos para corrida do mundo.
Eu adorava passar horas e horas na Feira e usava a manhã da sexta para isso. Ia corredor por corredor, olhando barraquinha por barraquinha. Fazia este trajeto umas três vezes. Duas só pesquisando e a terceira comprando o que precisava.
Se você esqueceu qualquer coisa para a prova, não se preocupe. Tem tudo na Expo.
Eu ia sempre bem cedinho, assim que abria, às 9 da manhã, para poder tirar a tarde inteira para descansar.
Se possível, não deixe a Expo para o sábado. A Feira é aberta a todos os chicagueans, não apenas aos corredores. Sábado o crowd fica imenso, muito maior que na sexta, e isso deixa o passeio mais atrapalhado, as filas maiores, os estandes mais bagunçados.
Em 2011, perdi o avião na quinta e só cheguei em Chicago no sábado. Fui direto do aeroporto pra Expo. Pude ver a grande diferença.
Ah, você encontra ônibus escolares, aqueles amarelões, que vão e voltam o dia todo e de graça.
Na região da Michigan Avenue tem uma loja da Nike, parada imperdível.
Você ainda encontra esses ônibus em praticamente em toda a cidade, basta acessar o app da prova.
É a melhor forma de chegar até lá, o McCormick Center, um lugar tão impressionantemente grande que quando Chicago perdeu a chance de fazer os Jogos de 2014 para o Rio o projeto previa a realização de oito modalidades esportivas só ali. É um exagero o lugar, você vai ver. E a Feira, uma das maiores do mundo, como disse, ocupa só um cantinho do complexo.
Mais uma vez, skip the cab. Carece pegar com táxi não. Vá de school-bumba e gaste na Feira.
Outra coisa: a noite em que você vai conseguir dormir alguma coisa é a de sexta pro sábado. Do sábado pro domingo, esquece. Vais fritar no colchão bonitinho mas isso não vai te atrapalhar, acredite. A adrenalina é uma santa propulsora no dia da prova.
Aí chega o sábado
Sabadão cedo tem uma das coisas mais bacanas de todo o final de semana de coisas muito bacanas da Chicago Marathon.
Tem o trote da véspera.
Sugestão aqui do amigo: se pirulite pro Hilton da Michigan Avenue por volta das 8h45m do sábado.
E veja o que vai acontecer.
Mais de uma centena de brasileiros de vários grupos de corrida se juntam ali.
E saem juntos para um trote de 30 minutos.
Claro, se você vai com seu grupo e ele combinou outro lugar, siga o planejado pelo grupo.
Mas se estiver sozinho ou estiver sem planos, apareça no Hilton perto das nove da manhã. É uma energia muito bonita. Todo mundo ali, independente dos seus paces e planos de tempo de conclusão, com a mesma intenção: fazer uma prova legal no dia seguinte.
O trote é feito parte no Parque, parte pela margem do Lago e você vê, meio que de relance, a avenida por onde vai passar na hora da chegada no domingo. Seu coração vai tremer e é bom que você dê a ele esta chance, é um treino também.
Acabou o trote, se mande pro hotel.
Tem também a corrida de 5km, a exemplo do que acontece na NYC Marathon. Isso deve mudar o astral do trote do sábado descrito acima, porque vai deixar a região do Grant Park mais muvucada.
Portanto, dêem um desconto caso seja um pouco diferente do que você leu sobre o trote da véspera.
Se estivesse lá, eu me inscreveria na provinha dos 5km. É um sampling bem bacana do que você vai viver no dia seguinte.
Pra quem estará estreando na Maratona de Chicago é uma ajudinha a mais. Vale a pena.
Fim de eventos no sábado.
Porque sábado, meu caro, sábado é sofá e perna pra cima o dia todo.
E macarrão se possível sem molho pro molho não virar surpresa no domingo. Conheço caso de corredores que sequer largaram por causa de um molho estranho no jantar de massa no sábado.
Nos anos em que corri Chicago também tive a sorte de ser hospedado por amigos muito queridos.
Minha “Marathon Pasta” tinha cozinheiros e ingredientes absolutamente confiáveis.
Se este não é o seu caso, não arrisque. Massa na manteiga com salzinho e olhe lá.
Ok.
Chegou o domingão
É o dia da Maratona de Chicago.
Calma. Tá tudo nos conformes.
Você não dormiu, tá nervoso, tá escuro ainda e você não tem ideia do que vai acontecer.
Posso te contar algumas coisas pra você ir imaginando.
Vá para a largada de metrô.
É a melhor maneira.
Uber pode ser bom também, mas logo às cinco e meia da manhã a Michigan Avenue estará movimentada e os bloqueios da prova pela cidade podem fazer sua viagem de Uber ficar mais angustiada que você. Isso não será bom.
Vá de metrô
Mas como chegar até o ponto de largada se eu não conheço Chicago?
Se você achar uma estação de metrô vai ver milhares de pessoas indo pro mesmo destino que o seu. Maratonista é um cara de tênis sujo (não vá me estrear o tênis que você comprou na Expo no dia da prova, pelamor), com uma sacola plástica transparente nas costas, andando confiante pelas ruas às cinco da manhã. Isso é um maratonista amador.
Se você não souber onde tem uma estação de metrô, basta ir pra rua e caminhar.
Logo você vai encontrar um cara com a tal sacola plástica igual a sua. Depois mais um e depois mais outro. Quando três caras com tais características além de você estiverem andando na mesma direção, não tem outra: vocês quatro estão indo pro metrô.
É só seguir a tigrada.
Chegando na Avenida Michigan, mais uma das coisas bacanudas da sua Maratona: a concentração no lobby do Hilton Hotel. Vá para lá.
Porque você vai ver o que é uma Maratona Major antes mesmo dela começar: uma reunião de tipos de nações como você nunca viu na vida. Gente de todas as idades e vivências.
Eu adorava ficar sentado no Hilton só olhando aquilo tudo.
Chegava antes das seis da manhã só para curtir. Outra vantagem do Hilton: tem muito banheiro para você usar, e você vai usar. Um banheirinho de louça limpinha antes da prova é tudo de bom, vá por mim. A dica: use os banheiros do mezanino, muito mais vazios e tranquilos que os do subsolo.
Hilton visto e curtido, hora de atravessar a rua e entrar no Parque, onde você vai largar.
Aqui a dica é entrar no Parque com bastante antecedência, porque curtir o Parque coalhado de maratonistas também vai fazer parte das suas boas lembranças.
Depois dos ataques na Maratona de Boston, Chicago adotou uns scanners de segurança que deixaram a entrada no Parque bem mais vagarosa. Filas grandes. Então calcule um tempo para elas também.
No Parque só entram os corredores devidamente credenciados com seu bib, avise isso ao seu acompanhante (caso você vá para a largada com alguém) para ele não ficar frustrado. Ele não vai poder ver você largar dentro do Parque.
Entrando no Parque, procure o guarda-volumes correspondente ao seu número de inscrição. É stress-zero para guardar suas coisas.
A oferta de guarda-volumes é imensa e você não vai ter qualquer dificuldade em deixar seus pertences.
Pit stop no banheiro antes de largar
Outra dica valiosa: não precisa passar a grade e acessar a pista de largada com muita antecedência. Deixe pro último momento, porque fora das grades tem uma infinidade de banheiros químicos, que você não vai poder usar caso já tenha entrado pra avenida de largada. Os fiscais de grade são rigorosos. Entrou, não volta mais. Então, espere.
Outra coisa que pouca gente que está estreando (eu inclusive) sabe é que se leva muito tempo depois do tiro de largada para a sua corrida começar, efetivamente.
Ou seja, você não precisa ter pressa nenhuma para alinhar, a menos que você seja um competidor de elite. A gente fica naquela angústia de querer sair correndo logo depois que ouve a sirene de largada e não é assim.
Houve anos que eu demorei mais de 25 minutos para iniciar a corrida depois do tiro de largada. A massa se movimenta com vagarosidade, andando, até passar por baixo daquele pórtico gigante. Portanto, não precisa pressa.
Pode usar seu banheiro até mesmo depois de ouvir o tiro, aliás é o que recomendo.
Você vai lembrar de mim quando vir tanta gente urinando logo com 300 metros de prova, abaixo do primeiro viaduto.
Está no regulamento da prova: urinar sem usar os banheiros químicos em Chicago, que existem às centenas, é passível de exclusão do evento, o que não recomendo, evidente.
Aí começa a prova
Essa parte é com seu treinador, sempre lembrando que para uma maratona bem-sucedida planilha e treinador devem respeitados com o mesmo rigor.
Reservo-me apenas ao direito de fazer um comentário sobre o clima e outro sobre seu relógio GPS.
Começo com o GPS.
Chicago larga no centro da cidade, região conhecida como Loop. Tem muito prédio alto, com muita antena de rádio e TV. Nessa hora o GPS pira. Relaxe. Tá tudo certo. Lá na frente ele vai se ajustar.
O jeito certo é você se guiar apenas pelo cronômetro e pelas placas de km.
Ou milhas, dependendo de como você fez seus treinos.
Na última vez que corri lá, em 2014, havia marcação de km e km logo no começo da prova. Era bom para ajustar o passo pelo cronômetro.
Se não tiver este ano, vai ter de milha em milha, com certeza.
De 5km em 5km também tem placa, com certeza.
Se o seu GPS ficar doidão no início, não entre em parafuso e se guie pelas placas.
Uma sugestão que também pode ser útil são as tatuagens de ritmo que a Nike distribui free na Expo.
É uma tatuagem lavável com marcações em minutos por milhas percorridas. O indicado aqui, caso você aceite esta dica, é pegar duas tatuagens. Uma com o tempo final sonhado e outra com um tempo mais conservador. Coloque uma em cada braço. Digamos, o tempo pretendido no braço direito e a opção mais pessimista no outro. Aí você vai acompanhando, milha a milha, como está indo sua prova. Se o plano A não deu certo, mude de braço pro plano B e simbora.
O único senão é que não existem (ou não existiam até 2014) no sistema métrico, apenas no imperial.
Agora, o clima
Chicago é uma prova que às vezes reserva surpresas.
Para a época do ano normalmente o esperado é um dia frio.
Mas vi no Weather Channel que este domingo será ensolarado, com temperatura entre 6ºC e 12ºC, com ventos com 32km/h e umidade em 51%.
Das seis provas que corri lá duas foram no calor.
A dica aqui é curta: segura na primeira meia porque em Chicago esta parte da prova é quase toda na sombra e tem muita gente torcendo e gritando e batendo sininho. É uma doideira, você não está acostumado nem nunca viu aquilo.
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Lembre-se: você é um estreante, então ainda não sabe quanto custa errar a primeira metade numa corrida de 42km. Segura a primeira-meia. Faça o exatamente combinado com o seu treinador. Essa dica é preciosa.
Depois, tudo vai dar certo, claro, se você não esnobar nenhuma das inúmeras mesas de hidratação, ainda mais num dia quente como o previsto. Não esqueça seus géis e os suplementos combinados. Arrume sua pochete ou calção assim que chegar da Feira, logo na sexta-feira.
Divirta-se
Você é um privilegiado.
Está a algumas horas de fazer sua estreia num evento esportivo mundial, correndo ao lado de 50 mil pessoas e sendo aplaudido por 1,5 milhão de anfitriões, ainda mais num domingo de temperatura agradável, ao menos pra quem estiver assistindo.
Penúltima recomendação para a Maratona de Chicago: voe com o tênis da prova nos pés e com a roupa da prova na bagagem de mão. Gel e vaselina talvez não passem no raio-x da segurança na ida. Por que isso? Pra uma mala extraviada não te neurar num fim de semana tão especial.
Ah, finalmente a dica que talvez mais vai te ajudar: escreva seu nome na camiseta.
Com letras bem grandes.
Depois, você me conta se valeu ou não a pena deixar que soubessem seu nome.
Cheguem todos felizes e com saúde.
Vai dar certo.
Boa prova galera.”
Iúri Totti é jornalista, com mais de 30 anos de experiência na grande imprensa, principalmente na área de esportes. Foi o criador das sessões “Pulso” e “Radicais” no jornal O Globo. Tem 13 maratonas, mais de 50 meias maratonas e dezenas de provas em distâncias menores. “Não me importo em ser rápido. A corrida só precisa fazer sentido, dar prazer.”