Finalmente, as dores da Maratona! Mas da terceira! Começo este post plagiando a primeira frase do amigo Tarso Vicente. As dores da terceira maratona foram diferentes, menos intensas e duradouras, além de localizadas em outros lugares, coxas e canelas em vez dos joelhos.
Imagino que sejam menos intensas e duradouras por ser a terceira, mas também porque estava mais preparado para suportar os 42k. Uma maratona começa muito antes, na preparação que exige disciplina e na disposição para abrir mão de coisas de que se gosta. No meu caso, acredito, começou antes ainda, em abril, quando decidi mudar de assessoria esportiva para sair do asfalto, em busca de mais contato com a natureza e do menor impacto. A nova equipe é a Torres Trail Run.
Com a mudança, passei a fazer quatro treinos por semana em vez de três, além de subidas e areia fofa, que dispensaram a musculação. Também ampliei o pilates para duas vezes na semana, mantendo o domingo como único dia de folga para ter um lazer à noite no sábado. As alterações na agenda me obrigaram a trocar de professora no pilates e, com ela, faço mais exercícios de equilíbrio (propriocepção). Outra novidade foi a nutricionista. Agora, como mais comida de verdade e frutas, uso menos produtos específicos e caros. O resultado foi que fiquei menos gripado durante o treinamento e cheguei mais leve na prova, com menos gordura. Houve ainda mudança de postura. Levei mais a sério o descanso, me alonguei mais em casa e dei uma maneirada no álcool, inclusive suspendendo o consumo bem antes do que costumava fazê-lo.
A primeira prova, em maio, foram os 21k da Wine Run, em Bento Gonçalves. Já estava inscrito nos 21k do XTERRA Tiradentes, em setembro, quando decidi fazer os 42k da XC Run Búzios, em outubro. Convenci o amigo Tarso, da antiga equipe, a se inscrever para ter um parceiro de treino e boas conversas. Mas ele acabou desistindo por uma questão pessoal. Devemos ter feito um longão juntos. Como ainda não tenho intimidade com a galera da nova equipe, tive que treinar sozinho por muitos kms. Porém, encarei o desafio como preparação mental para a maratona. O treino mais longo foi de 25k com ladeiras, que fiz em 3h. Tiradentes foi um treino ótimo também para apurar a técnica e a mente. A corrida era à noite, com lanterna, e choveu o dia inteiro, estava um lamaçal. Acabei fazendo em 3h27…
Rodrigo na March na XC Run 2017A uma semana da maratona, confesso que minha cabeça deu uma pirada de nervosismo e ansiedade. Era preocupação em ficar gripado, porque fiz a última rodagem na chuva, e com o tendão que voltou a incomodar. Maluquices que espero que passem com a experiência. Na véspera da prova, também inventei de comer pastel e moqueca no almoço, o que não foi nada bom…rs. À noite, fiquei na massa com proteína e molho de tomate básico, sem invenções. Chegando no quarto, tomei um remedinho leve para dormir (receitado por médico e que já havia testado em outras provas) e peguei no sono sem problema. A mochila com tudo o que precisava levar estava pronta: géis de carboidrato e proteína, comida etc.
Finalmente o dia da prova
Acordei às 5h30. A largada era às 7h. Meus pais e meu irmão que mora fora do país estavam lá. O restante da família estaria na chegada, no mesmo local, a Rua das Pedras, por volta das 13h, avisei.
A prova é dividida em quatro trechos de 10,5k. Eu havia feito os dois primeiros em outro ano, dividindo os 42k com um colega. Os trechos 3 e 4 me preocupavam não só pelo desconhecido, mas porque traziam o maior morro e os costões de pedra que poderiam ficar mais complicados de atravessar dependendo da maré. Mas acho que Deus colaborou nesse dia. Apesar do tempo bem abafado, o sol só apareceu a partir do trecho 3 e a maré estava baixa no trecho 4.
Mesmo sabendo que poderia correr perfeitamente em algumas subidas, resolvi não arriscar no primeiro trecho e me guardar para o que estaria por vir. “Anda no difícil e corre no fácil”, orientou meu treinador aos atletas de primeira viagem. Passei bem pelo segundo trecho também. Graças a Deus novamente, a areia na Praia de Tucuns não estava fofa. Terminei os 21k em melhor tempo do que na outra vez. Pela transição para o trecho 3, recebi incentivo de atletas da Torres Trail Run.
Esse trecho começa com a maior subida da prova. Um morro que parece que não acaba mais. Lembrei do amigo Everton Costa, que disse que o meu estado ao chegar no topo seria um indicativo de como eu terminaria; e também do fera Chico Santos (segundo colocado), que ensinou técnicas de subida durante um treino da equipe. Cheguei bem no cume e fiz a descida toda correndo.
O ponto crítico foi quando o sol finalmente apertou. Já no fim do trecho, tive que alternar caminhada e corrida. O relógio havia parado e passei a tomar o gel conforme me sentia mais fraco. Na transição para o trecho 4,o final, comi uma banana. O Everton, que ali estava, me ajudou com a hidratação e orientou que eu retomasse logo e me recuperasse andando.
Rodrigo na March na chegada da XC Run 2017 nas Rua das Pedras, em BúziosDepois de passar por uma breve estrada de terra com carros levantando poeira, entrei na orla novamente. No último ponto de hidratação, descobri que faltavam 5k e estava bem para concluir. Cruzei com o antigo treinador, que me incentivou também em outro ponto da corrida. Nos costões de pedra seguintes, preferi andar rápido. Não tenho técnica para correr em pedras e não quis arriscar um acidente. Após mais uma subida, veio a reta final na praia. Para minha surpresa, encontrei o meu enteado para me acompanhar (ele fez o mesmo na minha primeira maratona, mas naquela vez foi combinado e eu estava um caco). Minha mulher aguardava no fim da praia e a família, já na Rua das Pedras, filmando. Passar por aquele corredor humano com desconhecidos te parabenizando foi emocionante. À direita, os colegas da nova equipe comemoraram a chegada de mais um Torres e eu retribuí levantando um dos braços.
Foram 6h24. Não importa. Cumpri meu objetivo, que era terminar me sentindo bem. Que feito! Ainda não caiu a ficha. Estou eufórico até agora escrevendo este post.
RODRIGO MARCH
Iúri Totti é jornalista, com mais de 30 anos de experiência na grande imprensa, principalmente na área de esportes. Foi o criador das sessões “Pulso” e “Radicais” no jornal O Globo. Tem 13 maratonas, mais de 50 meias maratonas e dezenas de provas em distâncias menores. “Não me importo em ser rápido. A corrida só precisa fazer sentido, dar prazer.”
…e nós emocionados – não é fácil o pórtico de chegada de vocês, muitas cenas impressionantes de superação. Orgulho total do seu trabalho, seu planejamento, sua resiliência, filho. Parabéns. Sabemos que todas essas características suas durante as maratonas na verdade espelham o que você é ; elas estão vivas em todas as suas atitudes, na sua vida. Show de bola !!
…e nós emocionados – não é fácil o pórtico de chegada de vocês, muitas cenas impressionantes de superação. Orgulho total do seu trabalho, seu planejamento, sua resiliência, filho. Parabéns. Sabemos que todas essas características suas durante as maratonas na verdade espelham o que você é ; elas estão vivas em todas as suas atitudes, na sua vida. Show de bola !!