Numa das últimas das 284 curvas da Serra do Rio do Rastro, na segunda edição da Mizuno Uphill Marathon, me peguei imaginando a felicidade de Bernardo Fonseca, o cara que, junto com sua equipe da X3M Brasil, criou a primeira maratona de subida do Brasil, em Santa Catarina. Vencedor da Ultramaratona e Maratona da Antártica, ele é conhecido por gostar de aventuras ao extremo. A prova daquele domingo (19/10) estava ao seu gosto, com um ingrediente que dificultou em muito a vida dos 300 corredores inscritos: ventos fortes, que em determinados momentos, causados por um ciclone extratropical, chegavam a 100km/h, arrastando banheiros químicos e derrubando patrulheiros em suas motos.
Como desta vez não queria repetir o erro de 2013, treinei muito. Gastei a sola do meu tênis em rodagens que chegaram a 35km pela ladeiras da Floresta da Tijuca. Peguei sol, chuva e até vento, mas nenhum com aquela velocidade que encontramos na Serra do Rio do Rastro, que parecia que estávamos correndo em uma esteira, pois era difícil sair do lugar.
No último trecho, após chegar ao planalto da Serra, a ventania era tamanha que estava quase impossível tentar correr na pista. A cada rajada, eu era jogado para o acostamento. Ao cruzar a linha de chegada, com o triatleta Kadu Costa ao meu lado, o banner do pórtico arrebentou, produzindo um estrondo assustador. A força do vento era tamanha que quase atropelei uma das moças que entregava as medalhas.
Após terminar minha oitava maratona, encontrei Bernardo sorrindo. Elogiei a “contratação” do ciclone para animar os quilômetros finais da prova. Disse a ele que encarar a Uphill “uma vez era loucura, duas vezes era algo insano e uma terceira vez era um caso de internação. Mas que ele reservasse uma camisa de força para mim na edição do ano que vem”.
O único porém da Uphill foi o lixo produzido pela prova. Com uma hidratação bem planejada, os corredores foram deixando um rastro de copos plásticos espalhados pela estrada por causa da falta de latas de lixo. Só em um ponto, quase no alto da Serra, vi um grupo do staff recolhendo copos.
Iúri Totti é jornalista, com mais de 30 anos de experiência na grande imprensa, principalmente na área de esportes. Foi o criador das sessões “Pulso” e “Radicais” no jornal O Globo. Tem 13 maratonas, mais de 50 meias maratonas e dezenas de provas em distâncias menores. “Não me importo em ser rápido. A corrida só precisa fazer sentido, dar prazer.”