Mas é claro que Eliud Kipchoge pode bater o recorde mundial da Maratona em Boston…

Eliud Kipchoge quer bater o recorde da Maratona de Boston e também o recorde mundial, que é dele. (Divulgação)
Eliud Kipchoge quer bater o recorde da Maratona de Boston e também o recorde mundial, que é dele. (Divulgação)

Por Sérgio Rocha

Eu sei que muita gente têm dito por aí que o queniano Eliud Kipchoge não pode bater o recorde mundial na prova em Massachusetts, EUA. Poder bater, pode. Agora, se vai valer, já são outros quinhentos.

Em 2011 dois quenianos disputavam palmo a palmo a liderança da Maratona de Boston em seus quilômetros finais. Eram eles, Geoffrey Mutai e Moses Mosop. Mutai, mais experiente. acabou se impondo no final e venceu a prova em duas horas três minutos e dois segundos com Mosop chegando quatro segundos depois.

Assistíamos a prova eu e o editor da revista Contra-Relógio, em sua casa, na Vila Madalena, São Paulo, e vimos o treinador Marcos Paulo Reis, que comentava a maratona ficar mudo com o resultado. Até porque por volta do km 30 ele havia dito que Boston não era prova para se bater o recorde mundial. E na verdade, ele não estava errado não. O recorde da prova até então era 2:05:52 do queniano Robert Cheruyiot, tricampeão em Boston. O problema é que os 2:03:02 registrados por Mutai, baixaram em quase 3 minutos o recorde da prova e em quase um minuto o recorde mundial da maratona, que na época pertencia ao etíope Halle Gebresselassie – 2:03:59, em Berlim 2008.

As regras da World Athletics para recordes

Mutai, na verdade, bateu mas não levou. O que acontece é que há regras da World Athletics para a homogação de recordes em corridas de rua e Boston fere duas delas, então, o queniano não pôde ficar com o título de recordista

Uma das regras é que a largada e chegada de uma prova não pode ter uma distancia maior que 50% entre elas. A Maratona de Boston é o tipo de prova que chamamos de ponto a ponto. Ela larga de uma cidade, Hopkinton e chega em outra, no caso, Boston. Isso é usado exatamente para evitar situações como a que ocorreu naquele ano, em que teve um vento forte a favor dos atletas na parte final, que pode ter ajudado no resultado final da prova.

A segunda é que a diferença de altimetria não pode ser maior que um metro por quilômetro. No caso da maratona, não pode haver uma diferença maior que 42 metros. A prova tem a largada 149 metros acima no nível do mar e a chegada está a 3. Acho que essa se auto-explica, né? Uma regra para evitar que organizadores façam provas em percursos com grandes declives para bater marcas.

Dennis Kimetto, em Berlim, acabou com o asterisco

Então como ficou sendo considerada a marca do Mutai, já que ele não pôde ser considerada recorde mundial? Permaneceu como recorde da prova, já que a regra da World Athletics só se aplica a recordes e ficou sendo considerada a melhor marca mundial de maratona. Então nós, que trabalhamos há anos com corrida, tinhamos sempre que levar em consideração dois resultados quando falávamos da maratona masculina – o recorde mundial e a melhor marca mundial. Quem nos ajudou a acabar com essa história e o asterisco nos recordes mundiais foi a vitória do queniano Dennis Kimetto em Berlim, três anos depois, com 2:02:57, marca que só veio a ser batida 2018, adivinha por quem?

Então é isso. Eliud Kipchoge pode sim, bater o recorde mundial na Maratona de Boston, que pertence a ele mesmo. Só não vai ser homologado. Simples. O único detalhe é que ele disse que tentará bater a marca de Mutai e isso, eu gostaria muito de ver acontecer, afinal de contas, estamos falando de um recorde que já dura 12 anos.

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Sobre Iúri Totti 1379 Artigos
Iúri Totti é jornalista, com mais de 30 anos de experiência na grande imprensa, principalmente na área de esportes. Foi o criador das sessões “Pulso” e “Radicais” no jornal O Globo. Tem 13 maratonas, mais de 50 meias maratonas e dezenas de provas em distâncias menores. "Não me importo em ser rápido. A corrida só precisa fazer sentido, dar prazer."