O Facebook me avisou há quatro dias que uma reportagem que fiz para o meu antigo blog, Pulso, do Globo, em parceria com Victor Costa, estava “fazendo” aniversário de 3 anos. Era uma entrevista com a coach esportiva Vanessa de Figueiredo Protássio, que falava sobre a força da mente para o esporte. Como o tema é atemporal, vale a pena compartilhar novamente com vocês.
Vanessa de Figueiredo Protássio. Foto de Marcos Semola
Por Iúri Totti e Victor Costa (6/6/2013)
Campeã da Corrida da Ponte e da Maratona do Rio em 1982, essa psicóloga carioca calcula que já deu uma volta ao mundo pela quantidade de quilômetros que correu desde os 28 anos. Hoje, aos 59, Vanessa continua treinando forte — os 42km de Santiago, em abril (2013), ela completou em 3h35m04s —, e sua meta agora é difundir o sport coaching, um programa de treinamento que trabalha o psicológico do corredor para melhorar seu desempenho. Ela fala dessa ferramenta que pode ajudar quem vai correr a Maratona do Rio, daqui a um mês (6/7/2013).
O que é o sport coaching?
É uma modalidade de treinamento com foco na atividade física e no desenvolvimento do atleta, seja ele amador ou profissional. Ele é aplicado de forma a complementar o treinamento técnico. Enquanto o treinador atua no treinamento físico, o coach esportivo atua no mental. O treinamento de sport coaching se estabelece como uma relação de parceria, em que o coach, o treinador e o atleta/equipe trabalham para cumprir objetivos e metas através, entre outros pontos, do autoconhecimento, da administração do tempo e da motivação.
De onde surgiu a ideia do sport coaching?
A profissão de coach esportivo é muito importante na Europa e na América. Tenistas, jogadores de futebol americano, beisebol, golfe, entre outros, contam com um coach, que se trata de um técnico mental para melhorar seus desempenhos. Me senti entusiasmada a atuar nesse mercado, sabendo que poderia contribuir com a experiência positiva que adquiri com as minhas maratonas e com a carreira de psicóloga clínica. A minha especialização foi realizada através do Instituto Brasileiro de Coaching (IBC), com instituições de neurolinguística e na formação de coaching desportivo, em Lisboa.
Como está o Brasil nesse mercado?
O estudo “A atuação profissional em coaching e os desafios presentes e futuros nessa nova carreira”, publicado em 2012, diz que no mundo existem 16 mil pessoas habilitadas nessa carreira, sendo duas mil no Brasil.
Em quanto tempo se pode ver o resultado?
O processo de coaching tem início, meio e fim. Dura em média de 10 a 12 sessões, com uma hora de duração, e pode-se dizer que na primeira sessão o atleta já se mostra positivo. Através de ferramentas específicas, é desenvolvido um processo para atingir o equilíbrio e comprometimento com novos desafios. Essa ação, consequentemente, promove uma melhoria na sua qualidade de vida.
Vanessa comemora o primeiro lugar na Corrida da Ponte de 1982
Corredores da Maratona do Rio. Foto de Thiago Diz/Divulgação
Qualquer pessoa pode ter resultados positivos com o coaching?
Qualquer um que queira se transformar. Através da ativação das competências e da aquisição de novas atitudes e habilidades, surge uma nova perspectiva para a vida. No sport coaching, o atleta trabalha de forma proativa, atuando para melhorar a estrutura da própria vida e seu desempenho no esporte.
O que os atletas buscam no sport coaching?
Em algum momento, o atleta pode ter dificuldades em atingir seus objetivos ou de trabalhar em cima de sua capacidade. Isso significa que ele precisará potencializar tais aspectos através do treinamento mental. Uns precisam de estímulos para iniciar um processo, enquanto outros precisam de motivação para gerar continuidade a fim de alcançar sua meta.
Como o sport coaching ajuda a melhorar o desempenho de um corredor?
Com o treinamento mental, são ativadas as competências do atleta para a construção do foco e da responsabilidade para o cumprimento de objetivos. É construído um caminho a ser percorrido no qual outras habilidades serão ativadas para se obter uma jornada bem-sucedida.
Como é feito esse processo?
O trabalho começa com uma investigação sobre o cliente através da coleta de dados em que são descobertos os bloqueios que impedem a ação do atleta, seja ele profissional ou amador. Tomando consciência desses bloqueios, inicia-se a segunda fase em que, com o uso de ferramentas apropriadas, se gera uma mudança contínua em seu desempenho na parte mental, que acaba beneficiando também a parte física.
Como o corredor deve lidar com o fracasso?
Ao assumir a responsabilidade pela derrota, ele aprende a extrair da situação a real possibilidade de análise do comportamento para melhorar os seus planos de ação no futuro.
O fator psicológico pode impedir que a pessoa explore todo o seu potencial nas pistas?
O emocional é um fator decisivo no desempenho de um corredor numa prova, na conquista de uma vitória ou mesmo para a aceitação de um resultado. Ativar o controle emocional e trabalhar seu autoconhecimento são itens essenciais para manter o suficiente equilíbrio e para analisar o próximo passo.
O tal “muro” da maratona existe? O que fazer para vencê-lo?
O “muro” está sempre relacionado a uma parte da maratona (entre os 32 e os 38km da prova), em que as reservas energéticas do corpo já estão esgotadas por causa do exercício contínuo e prolongado. Usa-se esse termo para determinar o momento de dificuldade que precisa ser ultrapassado. Treinar a resistência, manter o organismo hidratado e em equilíbrio e explorar a autoconfiança são fatores essenciais para ultrapassar o tal “muro”. Acreditar na superação é o segredo para a conquista de uma maratona.
Como um corredor deve trabalhar seu lado psicológico antes de um desafio?
Deve-se trabalhar o autoconhecimento e reconhecer seus pontos vulneráveis. É preciso fazer a projeção do desafio, a visualização da situação e realizar trabalhos de reforço de pontos positivos.
A parte mental é tão importante quanto a física numa corrida?
Para o sucesso em qualquer atividade, é preciso uma organização mental. Numa competição, tanto de curta como de longa distância, o treinamento mental complementa o treinamento técnico, que se soma ao condicionamento do corpo. Se for mantido o trabalho em sintonia, o apoio do atleta está completo.
Quem pode orientar o sport coaching? O psicólogo ou o treinador?
Esse processo só pode ser aplicado por um profissional que tenha formação em coaching e prática na área de desenvolvimento de pessoas, cabendo ao treinador técnico reconhecer a necessidade de aplicação do processo em seus clientes.
Há sinergia entre o coach e o treinador?
Em alguns lugares do mundo, isso é uma realidade. O treinador técnico, o atleta e o coach trabalham de forma sistêmica, trocando informações importantes. Aplicar estratégias técnicas e mentais com base em informações compartilhadas garante vantagens para que os treinadores atinjam a excelência do atleta. No Rio de Janeiro, alguns gestores esportivos prestam serviço de treinamento esportivo, principalmente no segmento das corridas e dos esportes de aventura.
Iúri Totti é jornalista, com mais de 30 anos de experiência na grande imprensa, principalmente na área de esportes. Foi o criador das sessões “Pulso” e “Radicais” no jornal O Globo. Tem 13 maratonas, mais de 50 meias maratonas e dezenas de provas em distâncias menores. “Não me importo em ser rápido. A corrida só precisa fazer sentido, dar prazer.”