Depois de uma temporada de mais de três anos morando fora do Brasil, retornei ao país em 2007 acima do peso. Comecei a correr apenas para perder os quilos que me incomodavam. Perdi peso, mas nunca mais deixei de correr.
Fui até os 21 quilômetros da meia maratona e a distância parecia ser o meu limite. Fiz inúmeras provas, até que, em abril de 2015, correndo minha 16ª meia maratona, tive uma morte súbita no quilômetro 19. O que poderia ser o fim da linha, foi um recomeço.
Três meses depois, estava de volta às pistas. Recomecei com 5km e a sensação era de estar completando uma meia maratona. Aos poucos, fui retomando o condicionamento físico e, um ano depois do acidente, cruzei a linha de chegada da minha 17ª meia maratona, ao lado daqueles que me salvaram, na mesma prova onde tudo aconteceu. Foi inesquecível.
A medalha de Goldenberg na Maratona do RioNo primeiro semestre de 2017, Bruno Bussade, o médico que me salvou, me propôs corrermos juntos uma maratona em 2018. Foi um susto. Maratona nunca fez parte dos meus planos. Parecia improvável. Significava dobrar minha distância predileta. Mas como não aceitar esse convite? Convidamos Cris Fernandez e Leandro Albuquerque – ultramaratonistas que fizeram parte da história em 2015 – a nos treinarem para o desafio.
Foram exatos 90 dias de treinamento intenso. E fomos muito dedicados. Três treinos longos. O primeiro, de 24 km, já emocionante, significou superar pela primeira vez os 21km. O segundo, de 28km, foi muito difícil. O dia estava quente, fazia sol, e subir a Niemeyer parecia impossível. Terminamos o treino exaustos, na dúvida se seríamos mesmo capazes de completar a maratona. O terceiro e último, foram 32km num dia nublado. Foi nesse dia que chegamos à conclusão que nosso ritmo ideal deveria ser de 5m40s/km. Completamos o treino felizes e confiantes de que seria possível fazer bonito, torcendo muito para que o dia também estivesse nublado em 3 de junho.
A noite da véspera. Razão. Corpo cansado precisa dormir. Emoção. Cabeça agitada deixa acordado. Foram mais de três horas rolando de um lado para o outro.
O dia da prova. Lá fomos nós, preparados mas nervosos, para a linha de largada. Dia nublado. Oba! Mantendo o ritmo de 5m40s/km, completaríamos a prova em menos de quatro horas e entraríamos para a seleta categoria “Sub 4” – aqueles que completam a prova em menos de quatro horas. Não era nossa meta, mas não seria nada mal. Nosso objetivo era cruzar aquela linha de chegada com saúde, sem caminhar em nenhum momento.
Corremos do Pontal ao Flamengo encontrando muito apoio e solidariedade pelo caminho. Gente vibrando, torcendo, aplaudindo, acenando e sorrindo. A energia do Leandro, da Cris, do William, do Reginaldo, do Edmo ao nosso lado na pista e de todos que em algum momento da prova também se fizeram presentes, tudo foi importante. Quando chegamos no Aterro, só faltavam dois quilômetros e acreditávamos que seria possível sermos Sub 4! Bruno acelerou nos metros finais e cruzou a linha de chegada com 4h00m27s. Cheguei logo atrás com 4h00m57s. A cidade do Rio ganhava assim mais dois novos maratonistas! M-A-R-A-T-O-N-I-S-T-A-S!
Se dezesseis minutos não foram capazes de tirar a minha vida, não vão ser alguns poucos segundos que vão tirar o brilho da conquista e da celebração de completar a primeira maratona. Porque especialmente depois daquele 12 de abril, cada segundo é motivo de absoluta gratidão.
Toda conquista é sempre inesquecível!
Cristiano Goldenberg
Iúri Totti é jornalista, com mais de 30 anos de experiência na grande imprensa, principalmente na área de esportes. Foi o criador das sessões “Pulso” e “Radicais” no jornal O Globo. Tem 13 maratonas, mais de 50 meias maratonas e dezenas de provas em distâncias menores. “Não me importo em ser rápido. A corrida só precisa fazer sentido, dar prazer.”