Espaço do atleta: relato de Fernanda Freitas na Meia da Maratona de Toronto

A primeira meia com frio, chuva e diversão
“Quando o Iúri me perguntou se eu topava escrever sobre a experiência de ter corrido a minha primeira meia maratona, respondi de cara:
– Claro que topo!
Eu estava  megafeliz por ter completado a prova poucas horas antes. Cheia de entusiasmo! Depois fiquei pensando que eu não teria uma grande história de superação para contar; nenhuma lesão grave que quase tivesse me tirado da prova… Esses perrengues pelos quais quase todos os corredores  –  amadores e profissionais –  passam ou estão propensos a passar devido ao ritmo intenso dos treinos. E – que fique claro – admiro cada um deles que consegue deixar as dores de lado e cumprir suas metas. Mas decidi escrever para mostrar como também é legal correr por pura diversão.
Subidão antes dos 5km da Meia Maratona de Toronto
Resolvi fazer minha primeira meia depois que decidimos – eu e Rodrigo, meu marido – visitar um casal de amigos que está morando no Canadá. A data da corrida coincidiu com a da viagem. Rodrigo foi então para a sua segunda maratona, e eu me animei com que ouvia dele: que estaria um friozinho de 10 a 15 graus (eu já tinha corrido 10km com 8 graus em Santiago e achei ótimo!) e que o percurso era todo plano, com leves descidas. Isso foi no fim de outubro do ano passado. Ou seja, eu – que além das provas de 10km, só havia feito uma de 16km – ainda teria seis meses para treinar até 1º de maio, dia da corrida. Moleza.
Eu adoro correr. De verdade. O problema é acordar cedo. Com tempo de sobra, fui adiando a data em que eu começaria a “treinar sério”. Deixei passar as festas de fim de ano, janeiro… E o dia que marcaria a volta aos treinos com a minha equipe – a Usports Club -, um sábado, 30 de janeiro, torci o tornozelo direito na descida da trilha do Corcovado. Foi um balde de água fria, mas eu sabia que, no fim, tudo daria certo. Não fui ao médico. Um vacilo. Tomei anti-inflamatório, botei gelo e fiz ultrassom. Até hoje sinto uma dorzinha quando viro o pé para dentro, mas no comecinho de março, o movimento da pisada já não incomodava mais. Daria tempo!
Comecei a correr três vezes por semana; quase sempre à noite porque o calor estava infernal. Eu só pensava na temperatura agradável do Canadá, em como seria mais fácil…. Nesse período senti aquele orgulho de mim mesma. Chegava em casa às 21h30m do trabalho e corria no calçadão de Icaraí, onde moro, até as 23h. Sozinha. A Thaís, minha amiga corredora e incentivadora, estava com dores na coluna e suspendera seus treinos. Eu treinava intercalando as orientações da planilha feita pelo Rossy Borges, treinador da Up, com umas sugestões do Rodrigo.
Contei esse episódio da  torção do tornozelo só para reforçar que não o encarei como um “graaaande” problema. Às vezes, o lado psicológico interfere no rendimento mais do que as limitações físicas. Quando decidi começar a correr, lá em 2011, não conseguia sequer trotar um minuto direto. Algumas semanas depois, estava fazendo a minha primeira prova de 5km. E se eu fosse mais disciplinada, já teria feito essa meia maratona há muito tempo. Mas levo a corrida muito numa boa, como puro lazer. Não corro por tempo. Claro que quando consigo me superar fico feliz. E quando vejo um colega de equipe correr 21km num pace de 4m54s penso que queria ser igual a ele (rs), mas não me cobro tanto. O objetivo nas provas é chegar, de preferência, sem andar no percurso.
E assim fui para Toronto. A surpresa lá foi a temperatura. No dia da corrida estava 8 graus, com sensação térmica de 4 graus e chuva. Um frio de doer os ossos (precisei comprar uma blusa térmica, de manga comprida). Saímos de casa eu, Rodrigo e Bruno, nosso amigo que nos levou na largada.
Rodrigo largou às 7h30m; eu, uma hora depois. Fiquei esperando num prédio anexo ao metrô, bem quentinho. Cinco minutos antes de começar a corrida, resolvi ir ao banheiro para ter a certeza  de que nada me atrapalharia. Resultado: a fila estava grande, e eu era a última. Só comecei a correr quatro minutos depois que a prova tinha começado. Já larguei atrás (rs). Antes do 5km,  uma megasubida (?!). Mas o percurso não era todo  plano? Corri quase até o topo, mas, admito, dei uma andadinha de uns dois ou três minutos porque fiquei com medo de forçar demais e ter que andar em outros momentos, o que eu não queria.  Pela primeira vez, corri com celular e tirei fotos no 7km, no 16km e num outro trecho superbonito do percurso: uma rua com uma ponte, cheia de árvores altas…
No pórtico de chegada
Achei infinitamente melhor correr no frio e na chuva do que nesse calorão que faz aqui no Rio. Curti demais a prova, superbem organizada. Saí do meu traçado e fui até o meio-fio bater na mão das poucas pessoas que foram às ruas nos incentivar (nem os canadenses tiveram coragem de sair naquele frio. Nos pontos de hidratação, o staff batia queixo, coitado, mal conseguia gritar “water”, “Gatorade”); ouvi a playlist que tinha preparado (que tinha de Oingo Boingo a Rage Against the Machine)… Mas a música que escutei em looping nos quilômetros  finais foi uma que o João Guilherme, meu filho, adora e eu passei a gostar também: “Jesus of Suburbia”, do Green Day. Ela tem mais de nove minutos e várias partes legais. Parece que são três, quatro músicas numa só, sabe? Pensei: vou ouvi-la umas três vezes e, pronto, terminou. Foi o melhor momento da corrida.
Depois, olhando o Garmin, vi que fiz um pace de 5m42s na volta 19. Hahaha. Inimaginável isso! Sempre corro a 7m15s… Bem devagar.  Fiz os 21,5km em 2 horas e 31 minutos, num pace de 7m01s. O ruim foi que eu tinha calculado um pace de 7m30s e acabei chegando antes do combinado com o meu amigo. Ou seja, não tinha ninguém me esperando na linha de chegada 🙁  Mesmo assim, fiz minha festa. Sorri, chorei, vibrei e fiz sefie, claro. Foi o que me restou (rs). Sofri de frio depois, com o corpo esfriando, roupa molhada… Parecia que meus dedos iam congelar. Mas logo o Bruno chegou e me socorreu com um casaco. Rodrigo também terminou sua prova bem e feliz. Horas depois, ele me perguntou se eu achava que um dia correria uma maratona.
– Claro que vou! 🙂
Tenho lido tantos depoimentos de gente que começou a correr maratona depois dos 50. Ainda estou com 42. Tenho um tempo aí para criar coragem e me preparar. Sim, preciso ser mais disciplinada também. Mas acho que dá. No meu ritmo, sem grandes cobranças e com um propósito único: a diversão. Viu só, Iúri?! Sigo seu mantra. E tem dado certo. Valeu! 😉
PS: Não tenho foto oficial da corrida. Cada uma custa quase 25 dólares! Muito caro.”
Fernanda Freitas

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Sobre Iúri Totti 1379 Artigos
Iúri Totti é jornalista, com mais de 30 anos de experiência na grande imprensa, principalmente na área de esportes. Foi o criador das sessões “Pulso” e “Radicais” no jornal O Globo. Tem 13 maratonas, mais de 50 meias maratonas e dezenas de provas em distâncias menores. "Não me importo em ser rápido. A corrida só precisa fazer sentido, dar prazer."

1 Comentário

  1. Fico impressionado com a superação de vcs, fase a fase. Realmente demais. Apesar de ter jogado futebol por mais de 20 anos, não consigo me imaginar fazendo uma meia ou maratona inteira … mas ….. vcs me provocam ! rsrsrs. Parabéns por mais essa.

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